PLANEJAMENTO ESCOLAR
Celso dos Santos
Vasconcellos fala sobre planejamento escolar
Especialista
critica a burocracia e diz que o coordenador pedagógico deve se aliar a outros
colegas para não se sentir sozinho
Paula Takada
Foto: Rodrigo Eribe
Celso dos Santos Vasconcellos já foi professor,
coordenador pedagógico e gestor escolar. Ao longo de sua extensa carreira de
educador, participou de inúmeros processos de planejamento nas escolas e gosta
de dizer que aprendeu muitas lições. "Às vezes, há uma tentação enorme de
ficar gastando tempo com problemas menores, quase sempre da esfera
administrativa ou burocrática. Justamente por isso é tão importante planejar o
planejamento", afirma. Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo,
mestre em História e Filosofia da Educação pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo e autor de diversos livros sobre esse assunto, o
especialista fala na entrevista a seguir a respeito dos meandros do processo de
elaboração das diretrizes do trabalho da escola.
Por onde se deve começar um bom planejamento?
CELSO VASCONCELLOS Depende muito da dinâmica dos grupos. Existem três dimensões básicas que
precisam ser consideradas no planejamento: a realidade, a finalidade e o plano
de ação. O plano de ação pode ser fruto da tensão entre a realidade e a
finalidade ou o desejo da equipe. Não importa muito se você explicitou primeiro
a realidade ou o desejo. Então, por exemplo, não há problema algum em começar
um planejamento sonhando, desde que depois você tenha o momento da realidade,
colocando os pés no chão. Em alguns casos, se você começa o ano fazendo uma
avaliação do ano anterior, o grupo pode ficar desanimado - afinal, a realidade,
infelizmente, de maneira geral, é muito complicada, cheia de contradições. Às
vezes, começar resgatando os sonhos, as utopias, dependendo do grupo, pode ser
mais proveitoso. O importante é que não se percam essas três dimensões e,
portanto, em algum momento, a avaliação, que é o instrumento que aponta de fato
qual é a realidade do trabalho, vai aparecer, começando o planejamento por ela
ou não.
É possível realizar um processo de ensino e
aprendizagem sem planejar?
VASCONCELLOS É impossível porque o
planejamento é uma coisa inerente ao ser humano. Então, sempre temos algum
plano, mesmo que não esteja sistematizado por escrito. Agora, quando falamos em
processo de ensino e aprendizagem, estamos falando de algo muito sério, que
precisa ser planejado, com qualidade e intencionalidade. Planejar é antecipar
ações para atingir certos objetivos, que vêm de necessidades criadas por uma
determinada realidade, e, sobretudo, agir de acordo com essas ideias
antecipadas.
Em alguns contextos, o planejamento ainda é
encarado como um instrumento de controle?
VASCONCELLOS Sim, em algumas
escolas e redes, ele ainda é um instrumento burocrático e autoritário. Em um
sistema autoritário, o planejamento é uma arma que se volta contra o professor
porque o que ele disser - ou alguém disser por ele - que vai ser feito tem que
ser cumprido. Caso contrário, ele foi incompetente. E, nem sempre, conseguimos
fazer o que planejamos. Por diversas razões, inclusive por falha nossa, mas não
unicamente por isso. No entanto, o movimento da sociedade e o processo de
redemocratização têm favorecido o conceito de planejamento como real
instrumento de trabalho e não como uma ferramenta de controle dos professores.
Qual a relação entre o planejamento e o projeto
político pedagógico?
VASCONCELLOS Nesse processo de
planejar as ações de ensino e aprendizagem, existem diversos produtos, como o
projeto político pedagógico, o projeto curricular, o projeto de ensino e
aprendizagem ou o projeto didático, que podem ou não estar materializados em
forma de documentos. O ideal é que estejam. Quando falamos do planejamento anual
das escolas, temos como referência o projeto político pedagógico.
É possível fazer um planejamento sem conhecer o
projeto político pedagógico da escola?
VASCONCELLOS Um projeto, a escola sempre tem, mesmo que ele não esteja materializado
em um documento. Agora, o ideal é que esse projeto seja público e explicitado.
Na hora do planejamento anual, ele deve ser usado como algo vivo, como um
termômetro para toda a comunidade escolar saber se o trabalho que está sendo
planejado está se aproximando daqueles ideais políticos e pedagógicos ou não.
Como evitar que o tempo dedicado ao planejamento
anual não seja desperdiçado?
VASCONCELLOS Nas escolas, o coordenador pedagógico é o responsável por esse processo.
É preciso prever momentos específicos para cada tipo de assunto e ser firme na
coordenação. Às vezes, há uma tentação muito grande em ficar gastando tempo do
planejamento com problemas menores, administrativos ou burocráticos. Então, é
muito importante planejar o planejamento, reservando momentos específicos para
cada assunto, e ser rigoroso no cumprimento dessa organização. Ele precisa ser
um coordenador pedagógico forte, mas onde buscar apoio para se fortalecer? Em
alguns casos, há o apoio da direção, mas é muito importante que ele faça parte
de um grupo com outros profissionais no mesmo cargo para trocar experiências e
sentir que não está sozinho nesse trabalho.
Com que frequência as ações do planejamento anual
devem ser revistas pela equipe?
VASCONCELLOS Eu insisto muito na reunião pedagógica semanal. Na minha opinião, esse
encontro não deve ser por área, e sim com todos os professores daquele ciclo,
daquele período. Se todos os professores, por exemplo, do ciclo II do Ensino
Fundamental do período da manhã estão presentes no mesmo momento, em um dia
fixo da semana, no período da tarde, durante cerca de duas horas, o coordenador
pedagógico pode montar reuniões por área, ou por nível ou gerais, conforme as
necessidades. Esse momento de encontro é imprescindível para planejar um
trabalho de qualidade com coerência entre os professores. Além de ser um
momento de socialização. Existem professores que descobrem coisas excelentes
que vão morrer com ele porque não foram sistematizadas nem ele compartilhou
aquelas descobertas. E, na hora do planejamento, há a possibilidade de reservar
um momento para isso.
Existe algum momento que deve ser planejado com
mais cuidado?
VASCONCELLOS Sim, as primeiras aulas. Principalmente das séries iniciais. Existem
estudos que mostram que a boa relação professor/aluno pode ser decidida nessas
aulas. Há pesquisas que vão além e apontam os primeiros instantes da primeira
aula como determinantes do sucesso da atividade docente. Então, se o professor
tem de preparar bem todas as aulas, as primeiras precisam de mais cuidado. E
não é só determinar os conteúdos a ser abordados, os objetivos a atingir e a
metodologia mais adequada. É, sobretudo, se preparar, tornar-se disponível para
aqueles alunos, acreditando na possibilidade do ensino e da aprendizagem,
estando inteiramente presente naquela sala de aula, naquele momento.
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