NASCE PRIMEIRO BEBÊ DE TRÊS PAIS
Nasce primeiro bebê de três pais (duas mães e um pai)
Casal, cuja mulher tem genes de doença rara, fez processo de fertilização no qual o médico retirou o núcleo de um dos óvulos da mãe e injetou o de uma doadora
Essa forma de fertilização foi aprovada legalmente no Reino Unido, em feveveiro do ano passado. Os pais de I.H., porém, receberam o tratamento da equipe norte-americana na unidade da clínica em Guadalajara, no México. Em entrevista à revista New Scientist, John Zhang disse que, diferentemente dos EUA, não havia impedimento para aplicar os métodos no México. O especialista ressaltou estar convencido de que fez a melhor escolha. “Para salvar vidas, é a coisa ética a se fazer”, justificou. Especialistas ouvidos pela publicação avaliaram que o trabalho vai intensificar a discussão sobre a técnica e pode até acelerar a aprovação dela em outros países. “É revolucionário”, avaliou Dusko Ilic, do King’s College London, no Reino Unido.
Na técnica autorizada pelos britânicos, o óvulo da mãe e da doadora são fertilizados pelo esperma do pai. Os núcleos dos óvulos fertilizados são removidos antes que eles comecem a se dividir, a doadora recebe o material retirado da mãe e passa a geri-lo. O procedimento, porém, não pôde ser feito com o casal jordaniano porque, como são muçulmanos, não aceitam a destruição de embriões. A solução encontrada por John Zhang e equipe foi retirar o núcleo de um dos óvulos da mãe e inseri-lo no óvulo, com o núcleo já removido, da doadora.
A combinação resultante — com o DNA nuclear da mãe e o DNA mitocondrial da doadora — foi, então, fertilizada com o esperma do pai. A abordagem resultou na criação de cinco embriões, sendo que apenas um se desenvolveu normalmente e foi implantado na mãe da criança. “A transferência do embrião resultou em uma gravidez sem complicações, com a entrega de um menino saudável em 37 semanas de gestação”, escreveram os autores.
Erro na mitocôndria
O problema genético que causa a síndrome de Leigh fica no DNA da mitocôndria, organela que fornece energia às células. Segundo os pesquisadores, 25% da mitocôndria da mãe de I.H., que é saudável, têm a mutação que pode levar à doença que mata 75% dos pacientes nos três primeiros anos de vida. Exames iniciais feitos na criança mostraram que ela tem menos de 1% da falha genética. Condição, conforme a equipe, que é muito baixa para o desencadeamento de problemas de saúde — seria necessário um comprometimento em torno de 18%.
Ainda assim, Bert Smeets, professor de genética clínica da Universidade de Maastricht, na Holanda, alertou, também em entrevista à New Scientist, que o menino deve ser monitorado quanto à incidência da mutação. Isso porque há uma chance de as mitocôndrias defeituosas se replicarem e ocorrer o aumento dessa taxa. “Nós precisamos esperar por mais nascimentos e julgá-los com cuidado”, advertiu o especialista.
Para Sian Harding, que analisou a ética do procedimento no Reino Unido, a equipe norte-americana parece ter feito uma abordagem ética, usando, por exemplo, um embrião do sexo masculino, o que evita que o bebê repasse para futuras gerações possíveis falhas no DNA — salvo raríssimas exceções, as doenças mitocondriais são herdadas da mãe. “É tão boa quanto ou melhor do que a (técnica) que vamos fazer no Reino Unido”, avaliou Harding.
O casal jordaniano tenta aumentar a família há quase 20 anos. Dez anos depois do casamento, ocorreu a primeira gravidez, que não vingou. A mulher, hoje com 36 anos, sofreu mais três abortos. Em 2005, quando nasceu uma menina, exames na criança mostraram a razão dos problemas de fertilidade: a mãe tinha os genes da síndrome de Leigh. Diferentemente dela, a filha sofreu as manifestações da doença e morreu aos 6 anos. Um segundo filho teve as mesmas desordens e conseguiu viver por apenas oito meses. Com a técnica dos três pais, o menino que veio ao mundo em 6 de abril último não apresenta os sinais da doença.
Complicações generalizadas
Em mais da metade dos casos, os primeiros sintomas da doença surgem nos primeiros seis meses de vida, de forma abrupta. No primeiro ano, costumam ocorrer a perda do controle da cabeça e do tônus muscular em geral, convulsões, dificuldade para sugar, vômitos, irritabilidade e choro contínuo.
Crianças acometidas pela doença quando estão mais velhas, no segundo ano de vida, têm dificuldade de locomoção, distúrbios respiratórios e dos movimentos oculares, deficit intelectual, entre outras complicações. A estimativa é de que a doença afete um em cada 40 mil nascidos vivos.
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